quinta-feira, 5 de abril de 2012

Ajuda da União para estados e municípios pagarem lei do piso não funciona na prática


Prevista em lei, complementação só pode ser acessada em nove estados; FNDE não informou quantos municípios solicitaram os recursos 

O principal argumento de estados e municípios que não cumprem a lei do piso salarial para os professores é financeiro: os entes não teriam, segundo alegam, condições orçamentárias de arcar com o aumento de salário e outras exigências da legislação.

A lei prevê, nesses casos, que a União socorra os entes com recursos extras, utilizando para esse fim até 10% do que já aplica no Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica). Esse valor chega a cerca de 1 bilhão de reais. 

Até hoje, cinco anos depois da aprovação da Lei do Fundeb e três anos depois da sanção da lei do piso, nenhum estado ou município recebeu esse recurso extra para atingir o valor mínimo do salário dos professores – de R$ 1.451 em 2012, para uma jornada de 40 horas (com 1/3 dela destinado a atividades extraclasse). 

Isso porque não conseguem provar a necessidade de complementação, ou não cumprem as exigências do MEC para o repasse (veja lista de critérios abaixo). O Observatório entrou em contato com a assessoria de imprensa do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) para saber quantos municípios ou estados solicitaram os recursos em 2011 e 2012, mas, até o fechamento desta edição, não obteve resposta. Em 2010, 40 municípios fizeram a solicitação, no ano anterior, foram 29. 

Uma Comissão Técnica foi designada pela Portaria do MEC no. 213 (de 2 de março de 2011) para avaliar os pedidos, com representantes do FNDE, da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação (Consed). Porém, nenhuma reunião dessa Comissão foi convocada até agora. 

Em posicionamento público em defesa da Lei do Piso, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação destaca a necessidade de regularizar o funcionamento dessa Comissão, que até o momento, não passa de uma “carta de intenções”: “as gritantes desigualdades regionais brasileiras e o injusto sistema arrecadatório vigente no país torna imprescindível uma participação decisiva do Governo Federal no financiamento da educação básica. Inclusive, isso deve ocorrer em respeito às disposições do artigo 211 da Constituição Federal, que trata do Regime de Colaboração e estabelece que cabe à União assistir técnica e financeiramente estados e municípios”, diz a nota (leia na íntegra aqui).

Critérios 

A Portaria 213 também estabeleceu uma série de critérios para os entes acessarem esses recursos. São eles: 1) aplicar 25% das receitas na manutenção e no desenvolvimento do ensino (previsão constitucional); 2) preencher o Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação (Siope); 3) cumprir o regime de gestão plena dos recursos vinculados para manutenção e desenvolvimento do ensino (quer dizer, a Secretaria da Educação deve ter controle sobre os recursos em conta própria, exigência da LDB que ainda não acontece em muitos municípios); 4) dispor de plano de carreira para o magistério, com lei específica (exigência da lei do piso) e 5) apresentar planilha de custos detalhada, demonstrando a necessidade e a incapacidade para o cumprimento do valor do piso. 

Além desses critérios, a complementação só pode ser requerida por estados e municípios que já sejam beneficiários da complementação da União ao Fundeb. Neste ano, fazem parte desse grupo Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco e Piauí.

Pesquisadores consultados pelo Observatório consideram os critérios justos – afinal, todos são exigências já previstas pela legislação – e criticam os problemas de gestão que afetam os municípios. Alguns, por exemplo, não conseguem provar que investem o percentual (25%) exigido na Constituição em educação. No entanto, os especialistas veem com bons olhos estender a ajuda para além dos entes beneficiários da complementação da União ao Fundeb. 

Esses nove estados possuem, juntos, 1.756 municípios. Ou seja, os outros quase quatro mil municípios (3.809), e os 18 estados restantes, não podem sequer pedir a complementação, mesmo que cumpram os critérios acima.  

Segundo Luiz Araújo, professor, mestre em políticas públicas em educação pela UnB e doutorando na USP, esse auxílio previsto é escasso e não conseguiria sequer ajudar esses nove estados, caso todos solicitassem. 

“A forma da redação do artigo 7° da Lei n° 11.494 de 2007 é muito restritiva e prejudica o esforço nacional para garantir que ocorra a valorização dos profissionais do magistério por meio do pagamento de um piso nacional”, escreveu Luiz em seu blog

Para todos poderem acessar a complementação

Existe um projeto de lei do Senado (PLS) que propõe estender a complementação da União a todos os estados e municípios que precisem de recurso extra para pagar o piso. É o PLS nº 215/2011, de autoria da senadora Marinor Brito (PSOL-PA). 

Luiz Araújo explica que esse projeto não tem previsão para ser votado, e acredita que não seja do interesse do Estado: “Se o governo resolvesse se mexer seria mais rápido.

A União não quer mexer nisso porque quanto mais ela mexe mais demanda tem. Quando ela começar a liberar recursos, vão pressionar para liberar ainda mais”.

O que a senadora propõe é retirar da lei do Fundeb a necessidade de que a complementação da União seja destinada apenas aos estados e municípios que não atinjam o valor mínimo (aluno/ano). Porém, João Monlevade acredita que mudar a lei do Fundeb não é suficiente pra alterar a regra, que está na Constituição - no artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Para isso, acredita, seria necessária uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC).

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